sexta-feira, 8 de junho de 2012

Os Miseráveis

Vitor nasceu no jardim das margaridas
Erva-daninha nunca teve primavera
Cresceu sem pai sem mãe sem norte sem seta
Pés no chão, nunca teve bicicleta


Já Hugo não nasceu, estreou
Pele branquinha, nunca teve inverno
tinha pai, mãe, caderno e fada-madrinha


Vitor virou ladrão
Hugo salafrário
Um roubava por pão
O outro para reforçar o salário
Um usava capuz
O outro gravata
Um roubava na luz
O outro em noite de serenata
Um vivia de cativeiro
O outro de negócio
Um não tinha amigo, parceiro
O outro sócio


Retrato falado Vitor tinha cara na notícia
Enquanto Hugo fazia pose pra revista
O da pólvora apodrece impenitente
O da caneta enriquece impunemente
A um só resta virar crente
O outro é candidato a presidente




Miserável é um termo um tanto quanto forte para adjetivar uma pessoa. Geralmente nos referimos aos miseráveis como marginalizados, principalmente os que estão à "margem" do dinheiro. No entanto, miserável é alguém desprezível, desgraçado. Miserável não é aquele que não tem o que comer, esse é o marginalizado que só se tornou desprezível aos nossos olhos por "mera" diferença econômica, causada por nós através da sociedade como um todo. Miserável é aquele que tendo o que comer, reclama. O verdadeiro agraciado é aquele que agradece pelo simples fato de viver, não com a visão conformista de que as coisas nunca mudarão, mas sim com a certeza de que um dia seu esforço será reconhecido através do velho sistema plantar-colher, que joga fora a ansiedade e a sede da justiça sem o bom-senso.

O desgraçado é aquele que sempre tenta justificar seus erros. O provido de dignidade é o que assume seus atos errôneos, e isso não é aplicável a somente alguns, já que todos sem exceção, cometeram e cometerão em algum momento da vida deslizes, vacilos e hipocrisias.

Quando chamamos de miserável algum desafeto enchemos nossa boca de ódio e prazer, na realidade deveríamos olhar pelo outro lado da moeda: miserável também é aquele que merece compaixão. Essa última frase pode parecer religiosa demais, cristã, taoísta ou budista ao extremo, contudo se analisarmos friamente, miserável também é o que desmerece o desprezível. Só é realmente digno daquilo que tem, aquele que consegue compartilhar. Despreze o desprezado e também se tornará uma pessoa miserável. Todos, em potencial, podemos escolher entre dar compaixão ou sermos merecedores dela.